segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Verdade seja dita. parte I

Eu me lembro bem daquele garoto
e também de suas reclamações,
dos seus olhinhos e de seu corpo gordo.
Lembro-me bem que ele morava
algumas casas da minha,
tinha os dedos curtos e mãos grandes,
mãos de vagabundo dizia minha avó.

Vai ser difícil esquecer como caçoei dele
no dia em que ele saiu para brincar com
a marca de batom da mãe no rosto. Ou
do dia em que ganhei a terceira nova bicicleta,
e ele estava com a primeira semi-nova.

Pretendo não ver mais, o albúm de fotos
onde o moleque nunca sorria devido
aos dentes encavalados.
Nem tão pouco voltar a rua em que
brincamos pela última vez juntos.

Queria recordar o motivo que
me fez acusá-lo de quebrar as janelas
de dois vizinhos, e depois rir da
surra que ele levou do padrasto.
E quem sabe saber se ele
chorava apenas quando ninguém via
ou se nas vezes em que brincávamos
de luta era só eu que me divertia.

Sempre me lembro desse garoto, do gordinho
invejoso, nunca feliz com a sua bicicleta
e dos momentos inesquecíveis para ambos,
eu e ele. Mas o que não lembro é
a expressão dele, nem do rosto,
lembro me dos olhos, verdes, brilhavam
como a ousadia dos rebeldes,
mas piscavam demasiado rápido para
percebe-lo.

O pior é que nos albuns de fotos
não vejo mais
meu sorriso de garoto,
vejo angústia e dor,
vejo amargura, insegurança,
vejo talvez meu pai,
ou minha mãe ou minha avó.

O garoto nunca mais vi,
ele sumiu, e em nosso último
encontro o gordinho disse que
não queria nunca mais brincar
comigo.
Eu fiquei por ali,
e sumi muito mais tarde,
queria vê-lo mais uma vez,
ou quem sabe apenas os olhinhos,
os olhinhos brilhantes e invejosos
para poder encara-los
e pedir uma a coisa,
a coisa mas importante
que ele não pode fazer antes por mim
e assim pedindo aliviando
minhas lembranças
gostaria apenas
de encara-lo e implorar,


Perdão.